UTILIZAÇÃO DO PSI NO HIPISMO

Por Carlos da Rocha Torres


Tornaram-se verdades absolutas duas regras que, atualmente, regem o hipismo brasileiro:
- cavalo para salto só se for BH ou importado da Europa;
- cavalo para adestramento só se for lusitano ou importado da Europa.

Tais verdades estão absolutamente corretas se o futuro proprietário do animal estiver enquadrado nas situações abaixo:
- tiver muito dinheiro sobrando;
- não tiver tempo para iniciar um cavalo;
- não souber iniciar um cavalo.

Não resta a menor dúvida que comprar um cavalo pronto para entrar em competição é muito mais agradável e muito menos desgastante do que ter de iniciar o cavalo, empistá-lo e após todo este período de trabalho verificar que o cavalo não reúne as condições que nós desejaríamos para o nosso animal de competição. Tal situação pode ser minimizada se houver um mínimo critério na escolha do animal, como veremos adiante.
Em decorrência de tal realidade, ficou relegado a plano secundário um mercado que durante muito tempo foi o principal fornecedor de animais para o hipismo (Adestramento, Concurso Completo de Equitação, Pólo e Salto de Obstáculos). Refiro-me, especificamente, ao animal puro sangue inglês (PSI), ou mestiço de puro sangue inglês.
Durante algum tempo acompanhei a transformação de animais PSIs oriundos do Jóquei Clube Brasileiro que eram levados para a Sociedade Hípica Brasileira e mais tarde, sem fazer um único exercício de exterior, se constituíram em excelentes saltadores.

Durante mais de quarenta anos pude montar e ver, montados por outros companheiros, excelentes animais PSIs, ou quase puros, competindo, com pleno sucesso, no adestramento, concurso completo de equitação, pólo e salto de obstáculos.

As Comissões de Compra de Animais (CCA) do Exército e das Polícias Militares iam ao Rio Grande do Sul, com muita frequência, para comprar animais, que, na sua maioria esmagadora, tinham um percentual entre 50% e 100% de sangue inglês. Recordem quantos cavalos com C maiúsculo tiveram origem em tal processo de seleção. Todas as estâncias no Rio Grande possuíam, pelo menos, um reprodutor PSI, que era o responsável pela melhoria genética do seu rebanho eqüino, em termos de altura, conformação física e aumento do valor agregado. Um cavalo crioulo com altura de 1,40m não podia ser comprado por estar abaixo da altura mínima (1,45m), ao passo que um mestiço de PSI com crioulo de 1,50m era comprado de imediato.

"Em todas as raças de cavalos desportivos internacionais, e assim deveria ser no BH (ainda não é), o PSI obrigatoriamente entra com 1/8 do pedigree, e o ideal é que tal percentual seja de pelo menos 1/4. A razão dessa obrigatoriedade decorre da capacidade do PSI influenciar todas as raças destinadas ao esporte, imprimindo com facilidade qualidades como a amplitude do galope, sangue, coragem e atitude aguerrida. Na Europa 15% dos garanhões das grandes Associações de Raça aprovados anualmente são PSIs , que são testados para temperamento, capacidade de salto, higidez e andaduras exatamente como os outros candidatos a garanhões. Esses animais são continuamente utilizados no refinamento e manutenção daquele 1/4 de sangue PSI necessário para a qualidade da raça dos cavalos desportivos como um todo".¹

"No BH, a seleção começou invertida: éguas PSIs (muitas vezes de péssima qualidade) e garanhão pesado importado, o que ocasionou , no início da formação da raça, uma enorme carga de PSI, que redundou em cavalos de temperamento ruim e com muitos problemas físicos. Culpa do PSI? Absolutamente não.Culpa da seleção equivocada das matrizes ideais para a cobertura. Por conta de tal realidade, instituiu-se na criação do BH uma "fobia" ao PSI. A grande maioria dos criadores baniu o PSI de seus cruzamentos , obtendo, então, grande quantidade de animais sem vida, desengonçados e extremamente tardios, que observamos, ainda hoje, oferecidos ao mercado consumidor".²

A título de ilustração, colocamos, como anexo, o pedigree de BALOUBET DU ROUET. Observem que, dos 62 reprodutores constantes do seu pedigree, 23 são animais PSI(AZUL), 15 são animais que realizaram corridas de trote na Europa(AMARELO), e apenas 10(VERDE) são animais Sela Francês.



A grande dificuldade da escolha de um animal PSI, para sua utilização no esporte hípico, decorre de uma constatação muito simples: a seleção do animal PSI escolhido para reprodutor nos grandes haras é baseada principalmente na performance do cronômetro. Se o cavalo foi um bom corredor, fatalmente irá para a reprodução. A importância dos seus aprumos e do seu tipo físico fica em plano nitidamente inferior aos resultados obtidos pelo animal nas pistas de corrida. Em conseqüência de tal fato, fica excluído da reprodução com as matrizes de melhor qualidade, nos haras destinados às carreiras, um grande número de animais PSI com tipo físico, temperamento, aprumos e conformação privilegiada para a utilização no hipismo. A fobia do BH, como já vimos, impede, infelizmente, que tais animais sejam utilizados nos criatórios de cavalos para hipismo, salvo as exceções de praxe.

Na escolha do cavalo PSI para o salto, o diferencial entre a boa e a má opção é o gesto das espáduas. Quanto mais avançado estiver o centro de gravidade de um PSI, maior deve ser sua velocidade. Tal fato explica o forte apoio que o animal PSI deposita na mão de quem o monta durante as corridas ou logo após deixar de correr. O animal PSI, no princípio do trabalho de iniciação hípica, tem como características principais estar com as espáduas enterradas e debruçado na mão do cavaleiro.
Em síntese, se o PSI levantar as espáduas, tiver uma estrutura óssea compatível com a futura destinação (não pode ter os membros muito finos, vulgarmente conhecidos como canelas de vidro) e não tiver lesões ósseas ou tendinosas decorrentes de sua utilização anterior nas corridas, podemos trabalhá-lo certos de que será um bom saltador.

No adestramento, verificamos as andaduras do PSI e seu temperamento. Se não transpistar nitidamente ao passo, desista e parta para outra escolha.

Selecionei algumas fotos (podem ser vistas ao final do artigo) que evidenciam as qualidades do atleta PSI empregado como cavalo de salto, concurso completo ou de adestramento. Observe as fotos e decida se vale ou não vale a pena pagar cerca de R$ 3000,00 por um PSI em final de campanha, com 4 ou 5 anos de idade, perfeitamente musculado e pronto para ser iniciado em qualquer das disciplinas equestres. Verifique as fotos e veja se é necessária alguma coisa além do que está mostrado para se obter um bom cavalo de hipismo. Atentem para o detalhe que nenhum dos cavaleiros e amazonas mostrados nas fotos é profissional, fato que valoriza de maneira extremamente significativa as diversificadas aptidões do animal PSI.

O fato do animal oriundo dos diferentes criatórios de BH já estar saltando em liberdade ou mesmo montado pouco significa, e não garante que o futuro comprador vai conseguir saltar da mesma maneira que está exibida na foto do catálogo. Lembre-se que tais animais são iniciados e trabalhados por profissionais, com todas as vantagens e inconvenientes causados por tal situação.

Quanto maior a quantidade de produtos oferecidos por um haras criador de BH, maior a possibilidade de serem negociados animais com deficiências na doma, o que se constituirá, sem dúvida, em problema insolúvel no futuro, fato que pode ser comprovado com facilidade aqui mesmo na SHPr.

Afianço, por oportuno, que não tenho qualquer preconceito ou ranço contra o BH. Pelo contrário, a determinação e o investimento dos criadores de BH alavancaram nosso hipismo de maneira incontestável, como comprovam as medalhas obtidas por nossas equipes em jogos Pan Americanos e Olimpíadas, bem como, principalmente, as atuações brilhantes de nossos BH nos Campeonatos Mundiais de Cavalos Novos.

Em meu caso particular, estou na situação oposta àquela enunciada no parágrafo 2 da presente trabalho:
- não possuo dinheiro de sobra;
- possuo tempo para iniciar um cavalo;
- sei iniciar um cavalo.
Por tudo isso optei pelo PSI.


Carlos da Rocha Torres
Instrutor de equitação


NOTA (¹ e ²): O presente trabalho foi revisado e enriquecido pela experiência profissional da Drª Adriana Busato, Coordenadora do Curso Superior de Ciências Eqüinas da PUC/PR, e consagrada criadora de animais BH através do Haras FB.






















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