Evolução Técnica das provas do Concurso Completo de Equitação - parte II
Por Carlos da Rocha Torres
Verificaremos agora, sob o nosso ponto de vista, quais foram os fatos diretamente responsáveis pela evolução técnica do CCE.
Alinhamos alguns fatos reais que comprovam as informações acima:
No Campeonato Brasileiro de 1971, realizado no Regimento Andrade Neves (RAN), após cumprirmos as fases A, B e C, chegamos ao
Cross de 7200 m, onde o obstáculo 18 era uma paralela de troncos de palmeira, de 1,20 m x 2,00 m, sem opcional, na altura dos
5400 m do percurso.
No CCI de Resende em 1973, todos os ginetes argentinos (exceto o Ten. Santa Maria com Tropical) sofreram quedas no
Cross Country. Não haviam obstáculos opcionais e tão pouco a regulamentação sobre os obstáculos de água.
Na pista de cross da AMAN, em virtude dos fortes aclives e declives que possui (morros do Bastião e Cancela Vermelha), não
houve um único conjunto que fizesse os 6300 m do percurso, na velocidade de 570 m/min, dentro do tempo concedido.
Realizou-se um CCI, em 1977, na cidade de Buenos Ayres, onde encontrei a Prova de Fundo mais forte de todas que participei ou
assisti. As fases A e C somavam 15120 m, a fase B 3450 m a 690 m/min e o Cross media 6840 m a 570 m/ min. Dos 10 animais da
equipe argentina, 5 foram eliminados. Dos 4 animais da equipe brasileira, 3 foram eliminados. Na prova de Fundo morreram dois
cavalos, e outro se acidentou seriamente. O calor insuportável que fazia no dia da Prova de Fundo (03 DEZ), sem dúvida,
contribuiu grandemente para o insucesso técnico da competição. O Cel Péricles com SUIÁ foi o vice-campeão do CCI. A diferença
entre o tempo do vencedor do Cross e o 2º colocado foi de cerca de 2 minutos.
A crença geral era de que a prova do PAN de 2007 fosse muito mais forte do que a de um Campeonato Brasileiro, fato que, na
prática, não foi confirmado. A extensão (5700 m) do Cross Country foi muito baixa, apesar de, como vige o atual regulamento,
as fases A, B e C não serem realizadas.
No CCI de 1973, em Resende RJ, o conjunto que venceu o Adestramento e a Prova de Fundo (Ten Santa Maria com Tropical) foi tão
duramente penalizado no duplo salto (Cancela rústica e Óxer rústico sobre brook) da prova de salto que terminou o campeonato
na 4ª colocação individual. Na pontuação válida hoje seria, pelo menos, vice-campeão.
É lícito ressaltar também a melhoria das características do animal que hoje compete no CCE, fruto de um melhoramento genético
extremamente significativo, com evidentes reflexos sobre sua altura, seu temperamento, brilho das andaduras e a maior
amplitude do lance de galope.
As conseqüências palpáveis de tais alterações foram:
- valorização (maior dificuldade) da prova de adestramento;
- desvalorização (menor dificuldade) da prova de fundo;
- desvalorização (menor dificuldade) da prova de salto de obstáculos.
Foi necessário então dar uma valorização maior às qualidades (tipo físico, andaduras, inserção do pescoço etc.) e ao trabalho
de adestramento propriamente dito do cavalo de CCE. O simples fato da prova de Cross exigir, agora, um cavalo que aceite um
grande domínio por parte de seu ginete já deixou fora da seleção para o CCE um expressivo número de animais cujo adestramento
deixava muito a desejar.
Tal conjunto de circunstâncias obrigou a uma radical mudança nos critério de escolha do cavalo do CCE, em virtude das provas
de fundo e do salto de obstáculos não mais decidirem a competição, em termos absolutos. O concorrente que ficar muito longe
dos líderes na prova de adestramento, por melhor que seja o seu cavalo nas outras provas, não conseguirá tirar a diferença que
foi estabelecida no 1º dia.
Verificaremos agora a compilação dos resultados de Badminton, o mais tradicional CCE de todo o mundo, em 1985 e as Olimpíadas
de ATENAS em 2004. Vejam como mudou o perfil estatístico publicado na revista Centauro no Quadro 02
(Ver 1a. parte deste artigo).
Examinaremos agora o Campeonato Mundial, realizado em Aachen - Alemanha em 2006.
Tal campeonato pode ser analisado mais detalhadamente, em virtude de haver farta documentação sobre sua realização no
www.relinchando.com, site espanhol que
apresenta os resultados de todas as disciplinas eqüestres nos Jogos Olímpicos e Campeonatos Mundiais. No caso do presente
Campeonato Mundial, existem resultados completos das provas de Adestramento, Fundo, Salto, além do resultado geral individual
e por equipes, o que facilitou enormemente o levantamento de dados sobre o campeonato.
Uma observação direcionada e atenta dos resultados do mundial possibilita elaborar:
Prestem a máxima atenção ao QUADRO 09 abaixo. Ele mostra o aproveitamento de 03 animais excepcionais que não obtiveram
medalhas, única e exclusivamente, em função dos maus resultados na Prova de Adestramento.
Observem bem que o cavalo que ficou em 56º lugar no Adestramento, a uma diferença de 27,20 pontos para o 1º colocado na prova,
apesar de suas apresentações espetaculares nas Provas de Fundo e Salto (sem pontos perdidos em ambas), só alcançou a 10º
colocação individual. Tal atuação, em tempos passados, levaria o animal a conquistar uma medalha, sem a mínima dúvida.
Tal fato evidencia, de modo muito claro, em nosso entendimento, que a importância do Adestramento cresceu enormemente para os
cavaleiros / amazonas que realmente pretendem disputar o pódio nas provas do CCE.
Vamos apresentar o argumento decisivo e convincente que comprova, de maneira insofismável, a enorme importância do
Adestramento no conjunto das provas que compõem o CCE de hoje.
Vamos supor que os animais constantes do Quadro 09 formaram uma equipe hipotética, a EQUIPE MARAVILHA, cujas características
principais foram:
Um resultado excepcional, sem a menor dúvida, pois nenhuma das equipes participantes do Campeonato Mundial logrou um resultado
tão enormemente significativo. Não me recordo de nenhuma outra equipe que obtivesse tal incrível resultado em qualquer outra
competição do CCE (toda a equipe sem ponto perdido nas Provas de Fundo e de Salto).
Pois bem, que medalha obteria a EQUIPE MARAVILHA no Campeonato Mundial de 2006?
A equipe MARAVILHA, apesar dos resultados inacreditáveis que obteve nas provas de Fundo e de Salto, alcançou apenas o 5º lugar
na prova de equipes, em função exclusivamente do seu péssimo resultado obtido no Adestramento. Coincidentemente, a filosofia
da EQUIPE MARAVILHA era a mesma adotada no CCE do passado, que não dava a mínima importância ao Adestramento, pois o Fundo e o
salto decidiriam tudo, ao final da competição.
Tais resultados nos possibilitam, ainda, elaborar diversas observações sobre a prova:



A participação do Brasil no Campeonato Mundial foi resumida a um único conjunto, que obteve o resultado abaixo:
Vamos supor que uma equipe brasileira houvesse participado do referido Campeonato. Seu resultado seria o seguinte,
considerando que os outros dois conjuntos perdessem 62,80 e 52,80 no Adestramento e perdessem zero ponto no Fundo e no Salto.
Tais resultados, embora superestimados, são considerados excelentes. Mesmo assim a equipe brasileira, como evidencia o
QUADRO 16, só alcançaria a sétima colocação na prova de equipes.
Tal como na equipe MARAVILHA, o mau resultado do Adestramento, destruiu qualquer chance de êxito para a hipotética equipe
brasileira, apesar de seu 5º lugar na Prova de Fundo e seu 4º lugar no salto.
A pura e simples comparação do resultado do Mundial de 2006 (QUADRO 07) com aquele apresentado no QUADRO 02 evidencia, de
maneira cristalina, como evoluiu a filosofia do CCE de antigamente para o atual.
Os resultados dos JOGOS PAN-AMERICANOS não garantem, em absoluto, um bom desempenho em competições onde a quantidade e,
principalmente, o nível técnico dos concorrentes estejam em um patamar nitidamente superior. Os Estados Unidos e Canadá, de
acordo com seus interesses, enviam ao PAN equipes médias ou fracas. Nas Olimpíadas e Jogos Mundiais, ao contrário, sempre
equipes fortes. Nenhum dos animais que representaram os EUA e o Canadá em Aachen/2006 veio ao PAN 2007. O Quadro 17 abaixo
apresenta os resultados da prova de Adestramento dos animais que representaram o Brasil no PAN do RIO de JANEIRO. Observem que
a atuação de tais animais confirma a constatação reconhecidamente sabida de que o adestramento continua sendo nossa prova mais
fraca, no conjunto das provas que integram o CCE.
CHEGAREMOS AO QUADRO ABAIXO, APENAS PARA EFEITO DE ESTUDO, FAZENDO A COMPARAÇÃO ENTRE O SOMATÓRIO DOS DAS TRÊS MENORES
PONTUAÇÕES DE CADA EQUIPE NA PROVA DE ADESTRAMENTO.
Merece destaque especial a melhoria do resultado do animal POLITICAL MANDATE no Mundial de Aachen e no PAN.
Observem o quadro comparativo:
Tal diferença de pontuação pode ser creditada a uma melhoria significativa do animal na Prova de Adestramento, o que é muito
auspicioso, ou a diferença de critérios entre os dois juris.
Um grande número de animais que hoje compete no CCE consegue obter excelentes resultados, tanto nas provas de adestramento,
como no Fundo, como no Salto, evidenciando uma melhoria extremamente significativa na oferta, seleção e trabalho de tais
animais. Já encontramos cavalos que perdem apenas 30 pontos no Adestramento, o que nos obrigará a trabalharmos com muito mais
intensidade em tal disciplina equestre, sob pena de passarmos à situação de espectadores privilegiados, e não a de um
concorrente que pretende, de fato, disputar a prova do CCE com chance real de obter medalha ou subir ao pódio.
Observem com atenção o QUADRO 16:
- Mesmo sendo a 5ª equipe na Prova de Fundo e 4ª equipe na prova de Salto, a prova de Adestramento levou o resultado da
hipotética equipe brasileira para longe das medalhas. A situação assume maior gravidade quando sabemos que, historicamente, é
no Adestramento que, invariavelmente, temos a parte mais fraca de nossas equipes de CCE.
É preciso que os cavaleiros brasileiros que tiverem o privilégio da participação futura em Olimpíadas, Campeonatos Mundiais e
outras competições internacionais não esqueçam:
- se não houver uma melhora extremamente significativa na execução de suas reprises de Adestramento, dificilmente conseguirão
grandes resultados nas provas do CCE. Está na hora de substituir a adrenalina e a emoção intensa do Cross e do Salto pela
paciência, dedicação, seriedade e humildade, qualidades essenciais tanto para aqueles que praticam o Adestramento por livre
arbítrio como para os que precisam praticá-lo por obrigação, como é o caso do CCE.
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